sábado, 5 de abril de 2008

Canções em papel

O copo estava vazio. Já o teria levado quantas vezes à boca? Quantas e quantas vezes já bebera o mesmo líquido naquele copo cheio de amargura? Era catastrófica a maneira como vivia a sua vida. Sem interesse, sem bons momentos, sem felizes contrariedades, sem tanta coisa! O sol, que hoje já não lhe tocava na pele, fazia-a parecer sem nenhum tipo de brilho. Estava tão cheia de ódio. O seu pai voltara a dizer o mesmo. "Tão vaca é a mãe como a filha". Como? Aquelas palavras ecoavam na sua cabeça, e faziam-na desejar não ouvir mais nada, nunca mais. Tapou os ouvidos, tentando não ouvir mais as palavras que vinham da sua consciência, fosse lá isso o que fosse. Doía-lhe a cabeça. Agora as frases eram gritadas por a voz familiar de seu pai. Uma nuvem tapou o sol, que tentava penetrar no seu quarto, agora tão cheio de vazio que não a deixava dormir. Voltou a encher o copo. Em quantos já iria? As lágrimas cobriam-lhe já a cara, como um lençol de água, quando o seu pai entrou. Os olhos vermelhos saíam das órbitas, qual cão enfurecido.
-Tudo isto é culpa tua! Tudo isto foste tu que criaste!
-Não interessas.
Mais uma vez, levou à boca a garrafa que tinha a seu lado. O pai olhava-a com estranha pena. Que interessava? Nada. Cuspiu-lhe na cara. Depois, fez-se tudo névoa. Percebeu então, que apesar de tudo, era o reflexo do mal amor que lhe deram, era a ovelha mais escura do seu rebanho. Já não queria saber. Acabou com a garrafeira, e caiu para nunca mais se levantar. Tudo o resto, já teria à muito ficado para trás das costas.

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